“E eu, tão calma, estava segura de que ía dar peito, sim.”


O quê, vais dar peito? Que horror, parecem umas vacas!” assim tal-qual, uma das minhas melhores amigas e mãe de duas garbosas raparigas! “Sempre para ali a pingar…” o nojo era evidente. E eu, tão calma, estava segura de que ía dar peito, sim. Achava era que com as maminhas pequeninas como são as minhas, a coisa não ía ser nada de especial…
O Nuno nasceu no Verão, num parto muito mais complicado do que a deliciosa gravidez tinha prometido, e por isso teve de ir para incubadora. Na Alfredo da Costa ajudaram-me a ir-lhe mostrando como era que a coisa humana funcionava, a encostá-lo ao peito, a convencê-lo que dali vinha coisa boa. Milagre concretizado, no dia seguinte era eu que tinha leite para dar e vender – e as enfermeiras pacientemente lá me ensinaram a tirá-lo com a bomba, que eu que fosse paciente também, que ele havia de aprender. Aprendeu. E o leite transformou-se num deleite, num momento único, como nunca mais iremos ter, de cumplicidades, ternura (essa sim, escorria)… bocadinhos só nossos, como não volta a haver. Teremos sempre muitas coisas boas, fisicamente entre nós, porque aqueles foram momentos absolutamente maravilhosos.
E o estado em que a Natureza me deixou, que Graça, um busto que só de ver nas fotografias hoje em dia acredito! As maminhas funcionavam, sim senhores, e estavam enormes!
Até para a auto estima, nestes momentos em que deixamos de ser o centro do Mundo para que eles sejam…
Mas desenganem-se os cientificamente estanques: a sabedoria popular tem razão, sim. Habituei-me à cerveja preta sem álcool, e como adoro salmão e bacalhau, abusei do pretexto antigo de que dão bom leite, e fui comendo sempre que podia. Mas sabia, lá no fundo, que provavelmente aquilo era só conversa antiga, e que eu estava era a aproveitar uma boa ideia… Até ao dia em que, alheada dos ditos populares, fui com uns amigos à “chinchada” a uma figueira conhecida, recheadinha de figos, fruto do meu mais profundo prazer. Nessa tarde e noite, alarvei em figos como se não houvesse amanhã. Adorava aquilo, e mal não me faria. Acordei a meio da noite, antes da hora da mamada (ele tinha 3 meses nessa altura): Agora sim, parecia uma vaca leiteira! Estava cheia até mais não, deitava por fora, literalmente, sem controlo possível. A produção NUNCA foi tão profícua, nunca foi tão abundante. Tirei, tirei, tirei com a bomba, e no fim de tirar, tirar, tirar, ele acordou e mamou, mamou, mamou até já não poder mais…
De qualquer forma, em geral, eu tinha leite a mais. Tirava em casa, com bomba manual, e congelava, para se um dia eu não estivesse e houvesse uma emergência.
Funcionava tudo como previsto: Antes dele acordar, subia-me o leite…. Ou se a voz dele chamava. Maquinal, perfeito. Tive um caroço grande e chato, e fiz tudo o que nos ensinam os pediatras e as enfermeiras e os livros, mas parecia que era inabalável. E que o bebé não tinha fome que chegasse nunca. É só uma questão de paciência, de cabeça, de saber dizer que não às visitas (eu nessa altura ainda não sabia…), de não querer ser super-mulher. Ajuda muito, a cabeça.Até para fazer leite, ou para o ajudar a não ser desperdício.
O Nuno mamou exclusivamente até às papas serem alternativa diurna e eu ir trabalhar. Mas continuou a mamar sempre, de manhãzinha e à noite, cinco meses. Até um dia, quando já era só mais por mimo meu do que por ele, em que tive um desgosto terrível, dolorosíssimo. Nessa noite quando lá cheguei, á boca dele, já só havia hábito, leite nem vê-lo. E ele achou muito natural…
O bebé seguinte veio a jacto, e um bocadinho depois de nascer, também na MAC, quando a enfermeira me perguntou se o queria pôr ao peito, eu disse “hum, podemos tentar, mas eu ainda não tenho leite nenhum…” já não tinha dúvidas que ía ter, que ía ser bom, mas achava que só mais lá para o dia seguinte… Foi só pô-lo a jeito. Agarrou-se logo à maminha, e o leite, ou o que o anunciava, apareceu. Novo milagre.
Mas desta vez ele mamava tanto, eu gostava tanto, e a coisa era tão boa em geral, que claro que a produção excedeu a procura, e formei dois enormes caroços. Foi aí que uma amiga belga me disse “ põe couves portuguesas. A sério, põe-nas à volta das mamas, como se fosse um soutien, por dentro do soutien. Á hora da mamada elas já estarão cozidas, lavas bem o peito, dás o leite e depois pões couves novas. Pode ser lombarda…. Vais ver, vais parecer a Gina LoloBrigida!!!”. Adorei a ideia, e sobretudo a hipótese de me safar daquele tormento sem estragar nada, sem ele dar por isso, sem haver rasto que me escurecesse aquela memória.
Minhas Senhoras (sim, e Meus Senhores), Viva a Couve! Não há melhor. Tive outro caroço mais tarde e voltei a fazer o mesmo, e recomendei ao longo dos anos a mais amigas – e não há que enganar! Parece que há um qualquer efeito da couve na pele que ajuda a amaciar tecidos, e a fluir o que quer que seja que os compõe e alimenta, facilitando que tudo o resto se passe em paz. É “a” receita do aleitamento, o meu top of the pops, não pode ser melhor (tirando o nosso aspecto, entre a dita Gina LoloBrigida e a Jane do Tarzan…).
O Zé mamou seis meses, e depois foi a passagem de ano. Fui cinco dias para fora, de bomba atrás, de carro, sem ele. Fui tendo cada vez menos, esforçava-me por não tirar muito para ver se não crescia mais (que típica!). Chegou o dia do regresso, dez horas de carro de volta a Portugal. É mesmo verdade: à medida que nos aproximávamos, o leite foi voltando. Achei que era só impressão, que era eu com saudades (muitas) do que sabia que nunca mais ía ter na vida – em princípio. Mas não, era mesmo, pura e simplesmente, leite. Porque estava a chegar-me a ele. Que mamou deliciado na minha maminha, depois de uma semana a papas e fruta… Só durou uma semana, mas foi dos Milgares mais bem conseguidos que já vi.
Como o nosso, de todos os dias. Como a vida. Como esta bênção, que não deveríamos descurar e de que deveríamos poder falar mais, mais vezes, com maior prazer ainda. Fomentar, criar condições, sorrir à passagem por uma mãe que amamenta num banco de jardim, comovermo-nos com um anúncio (não há) em que o único som fosse aquele delicioso, animal, baixinho e tãããão ritmado “glup, … glup, … glup” que eles fazem com mestria.
Não há NADA igual.
Eu só soube já crescida e mãe de filhos, que nunca tive peito. Pelos vistos não me fez falta, cresci saudável, correu tudo bem com a minha relação com os biberons, o corpo, a minha mãe.
Mas o que eu ganhei com o aleitamento dos meus filhos não tem nome, nem tempo e espaço para contar, é maior que eu, é a própria vida. E a sensação de escorrer ternura, vou levá-la comigo para sempre, em cada sorriso que lhes devolver.
Margarida Pinto Correia

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